Programa
de índio
No ano
de 1994 , quando tive o prazer de ser piloto da equipe Divisa,
junto a meu amigo Flávio Trindade, em uma etapa em Cascavel (PR),
haviamos combinado que daquela vez o carro já estaria pronto para
os treinos na quinta-feira, pois precisávamos buscar melhores
acertos para que pudéssemos continuar com chances no campeonato.
Me lembro que o tempo amanheceu chuvoso e ficamos praticamente
o dia inteiro esperando a pista secar. Como não havia nada mais
a fazer, no meio de uma leve garoa, eu o Trindade e o ainda não
cinquentão Gastão Weigerth ficamos batendo papo em cima do caminhão
da equipe. Um deles me perguntou, não me recordo o qual, onde
estava o nosso colega, piloto da cidade de Foz do Iguaçú, Sr.
Ruy Chemim? "Foi pescar no Paraguai!", lhes disse. Foi quando
um deles me colocou: "Que programa de índio, ir lá no meio do
mato, passar fome, não ter um lugar decente para tomar banho,
ficar longe de casa... ". Nós, os outros dois, imediatamente concordamos
com a colocação e ainda encrementamos com um pouco mais com argumentos
que surgiram na hora.
Passados
alguns anos, me pergunto: o que nós estavamos fazendo em uma quinta-feira
em cima de um caminhão tomando banho de chuva e passando um frio
danado? Isso sim não seria um programa de índio? A resposta é
simples: salvo rarríssimas exceções, nesses dezesseis anos de
pista, como piloto ou às vezes como expectador, todos somos bitolados
pela adrenalina que é o automobilismo. Quase ninguém gosta de
pescar, jogar baralho, dançar, sei lá... Futebol então... Todos
gostamos mesmo é de acelerar, ou do ambiente que é uma corrida
de automóvel. Estando ali, parece por alguns momentos que certos
problemas deixam de existir ou ficam menores. Em uma ocasião um
colega piloto, que assumidamente tinha problema com drogas, me
disse em uma reunião de pilotos: "Eu vendo tudo que tenho para
correr de carro, já pela droga não tenho certeza, automobilismo
é pior que cocaína!" Ou ainda, um outro colega esses dias na reunião
da Liga Paranaense de Pilotos e Preparadores, a LPPP, me disse
que se a mulher dele o mandar embora pra fora de casa ele está
se lixando, pois com automobilismo ele não precisaria de mulher
nenhuma. Bom, eu tambem gosto muito de correr, mas nesse ponto
acho que particularmente ainda prefiro as mulheres, a começar
pela minha.
Mas, deixamos
nossos trabalhos, nossas famílias, quase sempre, com rarríssimas
exceções, gastamos mais do que devemos, viajamos de madrugada
para estar na pista no outro dia para treinar (perdi as contas
de quantas vezes fiz isso), corremos, às vezes ganhamos, às vezes
batemos, e quando batemos com outros colegas quase sempre brigamos,
e quando dá tudo certo chegamos em casa com um troféu que quase
sempre é muito pior que aquele que seu colega ou filho ou conhecido
ganhou no futebol, ou no judô ou em qualquer lugar. Como li uma
vez em uma coluna do campeoníssimo Ingo Hoffman: "Automobilismo
é caro, arriscado, envolvente, é talvez o menor percentual da
face da terra onde existam profissionais bem sucedidos, mas se
você gosta, siga em frente, porque dinheiro nenhum no mundo paga
o carinho de ser reconhecido na rua por um desconhecido qualquer
ou o gosto que tem aquela bebida quente de quarta categoria que
tomamos quando estamos no pódium". Pelo que pilota por colocações
com esta, parabéns Ingo!
Até a
próxima,
Aloysio
Ludwig Neto
|