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Meu melhor retorno

Quando meu telefone tocou na terça-feira (18/11/03), no outro lado da linha era meu grande e velho amigo Ruy Chemim. "Lolo (meu antigo apelido), você vai correr a Cascavel de Ouro, estou lhe arrumando uma vaga com o Leitão (apelido carinhoso do Flávio Poerch)". Neste momento, confesso que minhas pernas estremeceram, pois sempre fui um apaixonado por automobilismo, mas que por diversas razões que não quero lembrar neste momento, prometi a mim mesmo não mais participar de corridas. Procurei frear a empolgação da possibilidade com a razão, explicando ao Ruy que eu estava a mais de 5 anos sem andar e que isto com certeza me deixaria muito mais lento, no caso de um retorno. Como o Ruy estava vindo a Curitiba, peguei-o no aeroporto e já dentro do carro ligamos para o Flávio, que de brincadeira falou: "vem pra cá, testa o carro e se gostarmos do seu desempenho e você quiser, participamos da prova. Vamos ganhar esta corrida Aloysio!". Com isto fiquei ainda mais apreensivo, inseguro... Como eu me sairia se me sentasse em um carro bom novamente? E isto eu tinha certeza: o carro do Flávio era muito bom.

Foram dias longos. Confesso que na quita-feira, dado a alguns problemas profissionais chequei a ligar pro meu o amigo Chicão, colaborador da equipe do preparador José Sorbara, que prepara os carros do Flávio Poerch e do Ruy Chemin, dizendo que provavelmente não iria a Cascavel. O Chicão naquele momento me disse: "estamos contando contigo, mas se não for possível a gente entende". A noite falei com minha esposa que esta poderia ter sido a última oportunidade de minha vida em voltar a correr. Ela me disse que nunca é a última oportunidade e que eu deveria arriscar, pois se meu desempenho fosse muito ruim, agradeceria a equipe e voltaria para Curitiba.

Decidi viajar na sexta-feira de madrugada. Mal dormi à noite. Durante a viagem procurei entender e colocar pra mim mesmo que não tinha obrigação de andar bem, pois 5 anos são 5 anos, e se meu resultado não fosse bom não iria frustrar-me por isto. Ao chegar no autódromo deparei-me com alguns amigos das antigas, e também com muitas caras novas. Alguns encorajaram-me muito, como o Saul Caus e o Ângelo Giombelli. O carro atrasou um pouco pra chegar a pista, mas assim que chegou pude fazer o primeiro contato, no carro do Ruy, a fim de amaciar o motor. Entrei nele, como nos velhos tempos apertei bem o cinto e ao começar a primeira volta me senti como se não fizessem 5 anos que não pilotava, mas no máximo 5 dias. Dei umas 15 voltas para marcar já um ótimo tempo. Me empolguei e a equipe pediu que fosse para o Voyage, o qual eu provavelmente iria correr. Mais umas 15 voltas e um tempo ainda mais baixo. Perguntei a equipe se a vaga era minha e todos me responderam com um sorriso: "é claro que sim".

À noite fomos jantar e havia então uma indefinição se andaria no carro do Leitão ou do Ruy. Mas acabou prevalecendo a idéia inicial, com o Leitão. Na cama à noite, ao pensar no que estava acontecendo, procurei mentalizar que eu precisava ser rápido nesta prova, mas acima de tudo constante. Não poderia arriscar o carro e a boa corrida que nos apontava.

No sábado pela manhã fui a pista no primeiro treino e logo de cara percebi que realmente estava muito competitivo, virando neste treino o melhor tempo entre todos os outros pilotos. Nos demais treinos da manhã andou o Flávio sendo que os tempos que ele estava virando para as condições do carro não restava dúvida: seriamos muito competitivos. Para tomada de tempo procurei me concentrar ao máximo, pois queria muito fazer a pole para esta corrida. Acabei me empolgando e errando na curva "Um" logo na primeira volta, o que avariou um pouco o equilíbrio do carro e principalmente o emocional do piloto. Fizemos o 2º tempo, muito próximo do 1º, o que foi muito bom, sem dúvida. Afinal, o que contaria para corrida era a regularidade.

No domingo amanheci ansioso demais. Dormi muito pouco, mas estava calmo. Na reunião com a equipe procuramos nos tranqüilizar. O Flávio que largaria e pedimos a ele que não arriscasse nada, pois, afinal, quem decidiria a corrida não era ele, mas eu e os pilotos da ultima sessão. Pedimos apenas que ele não perdesse contato com o pessoal da frente, o que seria fácil, pelos tempos que ele estava virando e pelo piloto que ele é.

Largada! O Flávio foi muito consciente e não se envolveu em brigas. Mas estava muito rápido e após cair para 3º voltou a ser 2º, assanhando-se para o 1º. Pedimos ele manter a calma e com isto, o Ciro Strigari, 3º colocado, ficou mais rápido. Pedimos ao Flávio que deixasse o Ciro passar. Em seguida, em um ritmo alucinante veio o Ruy, que tinha largado em 10º, mas já assediava o primeiro pelotão. Até por sermos da mesma equipe, pedi ao Flávio para também deixá-lo passar. No decorrer da corrida isto quase nos toma a vitória.

Com 40 minutos de prova o Flávio pediu que mudássemos a estratégia e trocássemos de piloto. Veio para o box. Saiu ele, entrei eu. Abastecemos, prenderam meu cinto, tentaram conectar meu rádio mas nada! Um pit stop nada bom e eu agora estava na pista sem rádio e sem água. O pior nestas condições é que não estávamos precavidos de placas, então, tinha que acelerar tudo e ver o resultado no final. Por sorte sempre tive o hábito de pegar meus tempos em meu cronômetro de pulso, o que me ajudou muito na concentração.

Andei umas 10 voltas quando vi o carro do Ciro saindo do reabastecimento e na volta seguinte o do Jaime Mello Jr., que havia pegado o lugar de Lauro Vianna. Vi que estava em um ritmo melhor que o deles, mas pouco depois o carro do Ciro parou com uma fumaça nas rodas. Me aproximei do Jaiminho e naquele momento pensei: "estou um pouco mais acostumado que ele a tocar estes carros com tanque cheio, vou ter que passá-lo e abrir o máximo possível, pois quando o tanque baixar, o bom piloto que ele é vai ser difícil segurá-lo". Como raramente se tem problemas em disputas com bons pilotos, passei-o ajudado por um erro de troca de marcha e gradativamente abri uma distância confortável, digamos assim. Foi quando avistei o Ruy, aproximadamente a reta na minha frente. Quando o vi, o primeiro pensamento que tive era que ele era retardatário. Fiquei umas 15 voltas com este pensamento somente preocupado em manter a distância do Jaiminho. Foi quando o Flávio conseguiu uma placa emprestada e me sinalizou com P2. Pensei: "se o Ciro parou, o Jaiminho eu passei, só pode ser o Ruy o líder". Me concentrei e parti para buscá-lo.

Cheguei nele! É muito difícil segurar a emoção ao descrever este momento! Ali estávamos, quase 20 anos depois, disputando a liderança de uma corrida importante. Mas ao contrário das anteriores, esta teria um sabor especial, pois somos mais maduros e menos atirados. Ele fez sinal para eu não passá-lo, mas esperei o melhor momento e fiz a ultrapassagem. Só que para minha surpresa, no meu vácuo ele ainda era mais rápido. Pensei comigo: "este cara nunca pilotou tão bem como eu, apesar dos anos que fiquei sem atividade". Para minha sorte ele acabou saindo da pista na entrada da reta e com isto me deixou respirar um pouco.

Recorri ao meu bom relógio de pulso para manter a concentração. Dei mais algumas voltas e recebi a placa de 2 voltas para o final. Ergui completamente o pé, comecei a pensar em minha última corrida, que acabei dormindo no hospital, das críticas malignas que recebi de pessoas que não esperava, mas principalmente agradeci a Deus por aquele momento.

Placa de 1 volta para o final: lamentei minha mulher e minha filha não estarem lá, ergui ainda mais o pé e novamente vi que o Jaiminho se aproximava, mas já era tarde: bandeirada!!! Chorei um pouco dentro do carro e como havia prometido jogar fora minhas luvas se ganhasse, assim o fiz. Ao chegar no box vi nosso amigo Ronaldo chorando, assim como tantos outros. Sai do carro e recebi os parabéns do Jaiminho. Também o parabenizei e agradeci a ele sua humildade em vir engrandecer aquela festa.

Foram um dos melhores momentos de minha vida, e sem dúvida minha melhor vitória e retorno.

Pódio. Depois a festa no apartamento do Leitão. Um dia mais do que especial, parecia tudo um grande sonho.

Até a próxima, pessoal.

Aloysio Ludwig Neto


Vou escrever mais sobre este evento, mas quero deixar registrado agora algumas posições e opiniões sobre esta prova e sobre o automobilismo em Cascavel:

  • Quando escrevi matéria "Automobilismo com o coração", tinha certeza de como minha gente (sou cascavelense) faz corridas. Só que eles desenvolveram-se muito mais e sem dúvidas tem um excelente Campeonato de Marcas. O Automovel Clube de Cascavel e o povo de Cascavel estão de parabéns, assim como a FPA, é lógico;

  • Tive a oportunidade de conhecer alguns pilotos que participam daquele campeonato, pessoas realmente muito legais. Vou esquecer de muitos, mas mando meu abraço para os irmãos Bastos, meu amigo guitarrista e agora concorrente Adriano, Paulo Vessaro, Ronaldo, Angelo Giombelli e Diogo Pachenki (ainda bem que eles não estavam com um carro muito competitivo), Saul Caus, César Chemin, o grande repórter Luciano Monteiro, Luiz Aperecido, Delci Damian, Tinho "Tasca", Juraci Massoni, Rubens Gatti, enfim, todas as pessoas que participaram daquele evento e que tanto carinho me deram em meu retorno;

  • Agradeço muito a equipe do Flávio Poersch em geral, começando por ele que me deu esta oportunidade. É um grande piloto e uma pessoa melhor ainda, sem esquecer do Zé (preparador José Sorbara), do Chicão (meu amigo de alguns bons anos e colaborador desta equipe) e dos "mecas", definitivamente uma piazada nota 1000;

  • Por fim, fiquei muito feliz e honrado por ter participado desta prova. E a vitória, nas condições que aconteceu, junto com aquela equipe, serão recordações que levarei comigo para sempre.

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