Garagem do Bellote-

Tradição germânica

Texto e fotos: Renato Bellote Gomes

A década de 70 foi uma das mais curiosas em termos de cores de carroceria e estofamento. Nos Estados Unidos, os muscle cars esbanjavam, além dos itens citados, muita potência. Por outro lado, na Europa, os pequenos esportivos dominavam as ruas.

O carro desta matéria é um legítimo puro-sangue alemão. Apresentado ao público em 1969, o Porsche 914 foi projetado através de uma parceria da empresa com a Volkswagen. A idéia era que o carro ficasse no meio termo entre a tradição e o baixo custo. Mas isso é difícil quando o veículo ostenta um brasão de Stuttgart.

Com quase quatro metros de comprimento e pouco mais de 1,20 m de altura, ele recebeu um motor de 1,7 litro e 80 cavalos. Até 1975 - ano em que sairia de cena - os compradores teriam a opção de escolher entre outros dois propulsores: 2,0 litros e o de 6 cilindros, com saudáveis 110 cavalos.

A idéia deste artigo surgiu numa manhã de terça-feira. Estava eu andando por uma charmosa avenida da Zona Sul, quando passei em frente a uma loja de carros importados. Entre um bólido de Maranello e uma víbora de Detroit, avistei o clássico modelo 1970, de cor laranja, brilhando na vitrine. Alguns dias depois, decidi voltar e conferir o carro mais de perto. Coisa de quem gosta do assunto. O problema é que ele não estava mais lá. Mas o proprietário, sim. O comerciante, que pediu para ser identificado apenas como Paulo, contou-me, em uma longa conversa, todos os detalhes do pequeno esportivo. Viagens ao exterior e muita dedicação fazem parte da história deste modelo.

O interesse por carros vem desde muito cedo. "Lembro bem, que no bairro onde eu morava no final dos anos 60 e início dos 70, era muito comum carros abandonados e muitas vezes depenados encostados na rua por meses, quando não anos", diz. "Acabávamos fazendo desses automóveis nossos pontos de encontro", relembra.

O 914 foi adquirido há pouco mais de cinco anos. Curiosamente, ele foi encontrado estacionado em uma garagem. "O modelo pertencia a um engenheiro, que o havia desmontado por inteiro, perdido peças e, por fim, acabou ficando desmotivado para terminá-lo", revela.

Apesar dessa dificuldade inicial, Paulo estava disposto a investir pesado no clássico. "Eu e um amigo queríamos um carro esporte, um genuíno e que não fosse réplica. Se fosse preciso gastar para deixá-lo "zero", seria em um modelo autêntico", comenta. "O 911 era muito caro, as Pagodinhas (Mercedes) inviáveis, e o 914, acredite, é quase o preço de um Envemo Cabriolet em bom estado", conta.

Depois de encontrar o modelo e fechar negócio, a parte mais demorada estava por vir: a restauração. E olha que o 914 está tinindo. Dando uma pequena volta para tirar as fotos, não se ouve nenhum barulho na suspensão. Tudo novinho, além da pintura brilhante.

Bom, sobre a restauração, uma verdadeira eternidade. "O processo todo, levando-se em conta que prezávamos pela qualidade absoluta, durou 5 anos ininterruptos. É impressionante a diversidade de problemas que vão surgindo durante a execução, assim como a complexidade dos mesmos", diz. A dificuldade de achar as peças também foi outro desafio para o proprietário e os mecânicos. "Peça de carro antigo nunca foi coisa fácil, ainda mais por quem pensa em originalidade. De nenhum modo eu estava a fim de adaptações", conta.

E já que o trabalho final ficou de primeira, vale a pena conhecer os profissionais que restauraram o carro. "O sucesso do projeto deve-se à dedicação e conhecimento do Omar Esteves, da oficina Fast Fix ((11) 6914-1020), assim como o Sr. Osny e o Júnior ((11) 3845-1057 e 3846-7372), que participaram da conclusão da parte interna", revela Paulo.

Mas a melhor parte da história é conhecer o esportivo em detalhes. Em primeiro lugar, se você é uma pessoa mais discreta, não compre um desses. A cor alaranjada e o estilo inconfundível fazem desse carro figurinha fácil no trânsito.

As belíssimas rodas Fuchs deixam o perfil ainda mais agressivo. Some-se a isso o pequeno teto removível e é possível ter uma idéia do que é passear com ele. A primeira marcha invertida - para trás - confunde quem não conhece o modelo. Mas ainda restam mais quatro. Pura diversão.

O conta-giros ocupa tradicionalmente o centro do painel e, ao contrário de seus "irmãos", a ignição não fica do lado esquerdo. Os bancos, por outro lado, são baixos e passam a sensação de que o motorista vai tocar o chão.

Realmente os colecionadores têm um denominador comum: a persistência. "Mais do que a satisfação do carro pronto, está a história desenvolvida no decorrer desses anos, conhecendo pessoas e dividindo experiências. Posso afirmar que valeu", conclui Paulo. Então, até a próxima.

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